Os cientistas comprovaram recentemente que a causa da morte
de praticamente toda a vida marinha durante a maior extinção em massa da
história da Terra foi o aquecimento global. Com os oceanos mais quentes, o
metabolismo dos animais foi acelerado, ao mesmo tempo em que as águas do
planeta ficavam com menos oxigênio. Essa combinação foi fatal. Este olhar para
o passado é importante para evitar que algo parecido se repita no futuro. Pode
parecer um cenário muito distópico, mas os sinais estão se repetindo.
Photo The Richest |
2018, foi o ano mais quente dos oceanos
De acordo com vários
estudos, o oxigênio, necessário para escapar de predadores, executar o processo
de digestão, respiração e outras atividades animais, não está tão abundante
como era para a vida marinha no planeta Terra.
Na última década, os níveis de oxigênio nos oceanos caíram
drasticamente, uma tendência alarmante e veloz ligada à mudança climática.
“Ficamos surpresos com a intensidade das mudanças que vimos, a rapidez com que
o oxigênio está baixando no oceano e o enorme efeito nos ecossistemas marinhos”,
diz Andreas Oschlies, oceanógrafo do Centro Helmholtz de Pesquisas Oceânicas
Kiel (Geomar), na Alemanha, cuja equipe monitoriza os níveis de oxigênio nos
oceanos em todo o mundo, numa entrevista para a revista Scientific American.
O maior problema, segundo Oschlies, é a velocidade e a
escala da queda dos níveis de oxigênio, uma questão que exige atenção urgente,
diz o pesquisador. Os níveis de oxigênio em algumas regiões tropicais baixaram
uns impressionantes 40% nos últimos 50 anos, revelam alguns estudos recentes.
Globalmente, os níveis baixaram uma média de 2%.
Animais marinhos grandes e pequenos são afetados até mesmo
por pequenas alterações no oxigênio, buscando refúgio em zonas com mais
oxigênio ou ajustando o seu comportamento. Esses ajustes podem expor estes
animais a novos predadores ou empurra-los para regiões com escassez de
alimentos. A mudança climática produz outros sérios problemas para a vida
marinha, como a acidificação dos oceanos, mas a desoxigenação é a questão mais
urgente que os animais marinhos enfrentam atualmente, segundo Oschlies.
A preocupação dos cientistas está localizada em mudanças nos
ecossistemas dos oceanos abertos e perto dos polos, locais que costumavam ter
muito oxigênio. As regiões costeiras perto do equador são locais de baixo nível
de oxigênio porque são águas ricas em nutrientes, onde as bactérias consomem
oxigênio à medida que se alimentam dos seres marinhos mortos.
“Os modelos climáticos que projetam mudanças futuras
subestimaram rotineiramente as perdas de oxigênio já observadas nos oceanos do
mundo”, afirmou Oschlies na revista Nature no ano passado.
Os efeitos de quedas no oxigênio em locais onde o
zooplâncton se reúne foram documentados num relatório de dezembro de 2018 da
Science Advances. “Eles são muito sensíveis”, diz Karen Wishner, líder do
estudo, oceanógrafa da Universidade de Rhode Island, nos EUA.
Algumas espécies destes seres na base da cadeia alimentar
nadam para águas mais frias e profundas, com mais oxigênio. Porém, chega a um
ponto onde afundar mais é mais difícil encontrar comida ou se reproduzir em
águas com temperaturas mais baixas.
Zooplankton. Photo: Matt Wilson/Jay Clark, NOAA NMFS AFSC Wikimedia |
Derretimento do gelo antártico pode submergir cidades inteiras
Além destes efeitos, os animais enfrentam vários outros
desafios fisiológicos à medida que seus corpos se ajustam para reduzir os
níveis de oxigênio. Segundo um estudo sobre Fisiologia e Comportamento Marinho
e de Água Doce feito no mês passado, camarões chineses balançam suas caudas de
forma menos vigorosa para economizar energia em ambientes com menos oxigênio,
tornando-se menos ágeis, o que os fez ter menos hipóteses de sobrevivência na
natureza.
Funções sensoriais básicas, como visão e audição, também
podem diminuir num oceano pobre em oxigênio. Estudos já mostraram que mesmo
pequenas quedas no oxigênio prejudicam a visão em alguns seres do zooplâncton, da
mesma forma que acontece com humanos quando vão para grandes altitudes e
respiram ar rarefeito. Muitas espécies de zooplâncton confiam na visão para
migrar pela coluna de água para evitar predadores, então a perda de visão pode
impedir sua capacidade de captá-las.
Algumas criaturas, como as medusas, são mais tolerantes os
baixos níveis de oxigênio do que outras. Mas todos os animais sentirão o
impacto da desoxigenação. “Qualquer queda no oxigênio vai prejudicar a
capacidade de sobrevivência e desempenho”,. diz American Brad Seibel,
oceanógrafo da Universidade do Sul da Flórida, à Scientific.
Um mapa dos
níveis de oxigênio dissolvido nos oceanos ( a ) e como os níveis de oxigênio
diminuíram ou subiram por década.
Photo Schmidtko, et al., Nature 2017
O que irá acontecer á humanidade se a Antártida colapsar
Além da ameaça direta à vida de todo o ecossistema marinho,
a falta de oxigênio nos oceanos também terá impacto na sociedade humana. À
medida que regiões ricas em oxigênio se tornam mais escassas, os atuais habitats
de peixes também diminuirão e forçarão espécies economicamente importantes,
como o atum, que gera globalmente cerca de 42 mil milhões de dólares por ano, a
habitarem novas zonas. Investigadores americanos descobriram que o habitat para
o atum e a pesca do espadarte diminuíram 15% entre 1960 e 2010 no nordeste dos
EUA devido à perda de oxigênio.
As “zonas mortas”, onde o oxigênio desaparece por completo,
podem forçar alguns peixes a buscar áreas de oxigênio mais altas. Isso pode
ajudar os pescadores a encontrá-los porque os peixes se reúnem nessas áreas
condensadas, mas também fornece uma falsa sensação de abundância que não será
sustentável a longo prazo, observa Seibel.
Para tentar alertar o mundo e resolver o problema da
desoxigenação dos oceanos, Oschlies ajudou a organizar uma conferência
internacional sobre o assunto em Kiel, na Alemanha, em setembro do ano passado.
Os participantes elaboraram uma declaração chamada Declaração de Kiel sobre a
desoxigenação oceânica para conscientizar os governos internacionais, as Nações
Unidas e o público, bem como exigir ações imediatas.
Os cientistas agora querem que governos e grupos
internacionais façam avanços mais sérios para diminuir a mudança climática e
reduzir a poluição, fator que agrava a diminuição do oxigênio. Os investigadores
modelaram a nova declaração após a Declaração de Mônaco, que Oschlies acredita
ter ajudado a aumentar a conscientização internacional sobre a acidificação dos
oceanos, em 2008.
“É realmente um alerta para o público e para as várias
agências governamentais e internacionais que essa é uma questão importante”,
diz Wishner, um dos mais de 300 cientistas de mais de 30 países que assinaram a
declaração. Seibel, também signatário, disse à Scientific American, achar ser
uma situação terrível.